OITIVA
PÚBLICA SOBRE CASOS DE VIOLÊNCIA POLICIAL
DISCURSO
DE ABERTURA
No
oitavo século antes as era cristã o profeta Amós
dizia:
"Ai
de vós que oprimis os fracos e que maltratais os
necessitados! Ai de vós que odiais os que defendem o
justo no tribunal! E que tendes horror de quem fala a
verdade! O que eu quero – diz o Senhor – é ver
brotar o direito como água e correr a justiça como
riacho que não seca!" (Am 4,1;5,10 e 24).
O
nosso povo está sofrendo. O nosso povo está sendo
massacrado.
Como
se não bastasse o desemprego, a falta de condições,
a fome, a precariedade ou a total ineficiência dos
serviços de saúde, transporte e educação! Também,
devemos aguentar a ausência de segurança e o arbítrio
e os excessos das força da "ordem pública".
Aqui,
nos nosso bairros, estamos vivendo uma situação de
guerra, de verdadeira guerra.
Uma
guerra silenciosa e rastejante, uma guerra de "baixa
intensidade" , como dizem, mas de grande violência.
Uma guerra não declarada e que não está na mídia
no dia-a-dia, a não ser que interesse ao estado para
mostrar como está levando a sério a criminalidade...
Vez
por outra esta guerra não fica tão silenciosa assim...
Aí chegam as forças de invasão com carros, caminhões,
cavalos e cachorros, helicópteros, jornalistas... São
as mega-operações, cada vez mais frequentes, da polícia.
Durante
a guerra do Iraque, às vezes parecia que ela tivesse
chegado até nós. A gente assistia pela janela, não
pela TV! Por que não fazem estas operações
pente-fino, estas buscas coletivas e ilegais, lá nos
Jardins, lá nos Morumbis da vida? Talvez encontrem
mais bandidos e muito mais perigosos do que aqui na
periferia!
Esta
guerra trás consigo medo, angústia, falta de
liberdade, toques de recolher, escolas e postos de saúde
fechados... e como toda guerra as suas baixas... Esta
guerra, no decorrer do tempo, faz mais vítimas do que
a guerra do Iraque.
Mas
como é só pobre que morre, quem sabe o número, que
liga, quem se preocupa?
Esta
guerra foi denunciada pela Anistia Internacional no
seu último relatório sobre a situação dos Direitos
Humanos no mundo. Tenho aqui um artigo da Folha de São
Paulo do dia 29 de maio 2003 com o título, "Anistia
compara Brasil a zona de guerra"
Citando
o artigo:
"Os
níveis de violência no Brasil são comparáveis aos
de zonas de guerra ou à situação em Israel e nos
territórios palestinos...
"Para
a Anistia, o maior problema no país são as 'execuções
extrajudiciais', em que 'milhares de pessoas' foram
mortas em confrontos com a polícia, 'muitas vezes em
circunstâncias descritas pelas autoridades como
resistência seguida de morte'. De acordo com os dados
do relatórios, entre janeiro e outubro de 2002, 703
pessoas foram mortas pela polícia em São Paulo...
Desse total, 652 foram registradas como 'resistência
seguida de morte'.
A
Anistia também denuncia o fato de que a atuação da
polícia no Brasil se concentra naqueles que vivem em
'áreas mais marginalizadas, com menos acesso à proteção
do Estado ou da Justiça', segundo ele.
Esta
violência toda tornou-se espetáculo nos meios de
comunicação, especialmente na TV, para convencer
todo mundo de que a periferia é mesmo covil de ladrões
e assassinos e que a polícia agora vai resolver (como
iremos ver na gravação).
É
verdade que o crime tornou-se a única alternativa
econômica para muitos jovens onde o poder público não
oferece nenhuma alternativa.
Quem
sofre mais nesta situação são as famílias
trabalhadoras, as mães de família que perdem seus
filhos, as crianças que saem de casa com medo, que
vivem traumatizadas porque já viram coisas demais,
que criança não deveriam ver.
O
livro do Êxodo, ao cap. 3, na Bíblia, afirma:
"Eu
ouvi o clamor do meu povo, conheço seu sofrimento.
Por isso desci para libertá-lo" (Ex. 3, 7-8).
Hoje,
nós aqui das comunidades de base e do Centro de
Direitos Humanos do Sapopemba e das outras entidades,
damos as boas vindas a vocês:
-
representantes do povo massacrado
-
lideranças comunitárias, das entidades e dos
movimentos
-
e representantes do poder judiciário,
legislativo e executivo
que
são solidários e sensíveis às questões de direito
e da dignidade humana. Sejam bem vindos!
Nós
simplesmente queremos respeito, queremos que o povo
seja respeitado.
Nós
queremos um fim à violência, de todos as lados.
Queremos
uma polícia cidadã, uma polícia parceira, uma polícia
comunitária que dê amparo à população a garanta
os direitos fundamentais das pessoas.
Infelizmente,
o que se deve concluir hoje em dia, é que o fator de
maior insegurança aqui entre nós, e no país inteiro,
é o despreparo, a truculência e a corrupção das
força da "ordem". É só ler os jornais.
Nós
queremos uma polícia em que possamos confiar e não
ter medo dela.
Queremos
dialogar, como já vimos fazendo, com os setores da
polícia que querem as mesmas coisas, que não
esquecem de onde vieram..., e que também têm filhos,
mães, irmãs, irmãos, vizinhos...
Queremos
construir uma cultura de paz e não-violência, de
cooperação e de solidariedade.
Queremos
ver o nosso povo feliz através de políticas públicas
que dêem oportunidade às pessoas de se sentirem
cidadãos, e colocar a serviço da comunidade seus
imensos dons de fé, criatividade, comunicação e
utopia.
Queremos
hoje dar a palavra a quem não é ouvido, voz a quem não
tem mais voz porque ficou rouco de tanto gritar em vão.
"Bem
aventurados os construtores de paz, porque serão
chamados filhos de Deus." (Mt 5, 9).
Obrigado!
Pe.
Renato Lanfranchi
Parque
Santa Madalena – Sapopemba – São Paulo
07 de junho de 2003
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